[Crítica] Não se Preocupe, Querida é um Filme B muito caro
“Filmes catástrofe” são sempre interessantes de se acompanhar. Pelo bem ou pelo mal, eles acabam servindo o papel da sétima arte de entreter, seja dentro ou fora da projeção. Nesse caso específico a diretora de segunda viagem, Olivia Wilde, ou fez sua obra-prima ou deu um tiro na própria carreira. Dadas as devidas proporções às polêmicas de set e as perguntas importantes sendo feitas (o Harry Styles REALMENTE cuspiu no Chris Pine em Veneza???) este texto vai tentar se desprender de todo e qualquer ruído de produção que pode, e VAI, alterar a percepção de seu telespectador sobre a obra… Afinal, arte não é sobre apenas o que está em tela.
Dito isso, vamos falar sobre Don't Worry, Darling?
Com uma premissa simples que você já leu em alguma outra contracapa, Alice é uma dona de casa que vive nos subúrbios em algum momento entre as décadas de 1950 e 1960. Com um marido gostoso, mas sem um pingo de carisma, ela parece ter a vida perfeita. Limpar a casa, fazer compras e preparar três refeições por dia. Parece ótimo, não? O Twitter aparentemente já bateu a tecla sobre a histeria da personagem, afinal, nada parece mais agradável do que servir o Harry Styles numa realidade oca saída direto de um comercial de margarina… Pera, eu disse que ruídos do exterior do filme não iriam macular esse texto, vamos voltar!
Dentro de sua rotina de mulher bem comportada, ela começa a perceber certos padrões e repetições que a fazem questionar a realidade em que vive, aos poucos ela começa a enlouquecer e se perguntar se alguma coisa está errada.
A premissa é básica, o twist é básico. Tudo o que esse filme têm à apresentar ou foi melhor concebido em qualquer versão de Mulheres Perfeitas, livro de Ira Levin, ou em algum episódio de Além da Imaginação (e sua sucessora tecnológica, Black Mirror, é impossível não pensar na série enquanto se assiste à… Isso). O ponto aqui é a máxima que acredito rondar o cinema como um todo: bons diretores fazem milagres com roteiros medíocres.
Não se Preocupe, Querida não tem absolutamente NADA de novo para oferecer. Em alguns momentos ele parece saído de um boot de horror político que precisa usar todas as suas forças para verbalizar sentimentos que você passou as últimas horas sentindo, mas aqui há um fator muito interessante que parece controlar bem o trem desgovernado de gerar uma verdadeira catástrofe: a mão forte de uma diretora extremamente talentosa.
Olivia Wilde dirige até a carne cada cena desse filme e ela sabe como ser visceral. Unida pela potência e presença de tela de sua protagonista, Florence Pugh está sempre excelente, ambas parecem entender melhor a história que estão contando que o próprio roteiro. A realidade de Alice racha aos poucos na tela e, mesmo que o texto falhe em desenvolver o enlouquecimento da personagem, a meticulosidade das cenas, somada à performance de Florence, elevam uma longa sequência de momentos episódicos à algo tão sufocante que você sente as lágrimas daquela mulher descendo no próprio rosto, é igual ácido: machuca. Os ruídos estão aparentes, mas as cenas são tão bem montadas que qualquer telespectador que não foi infectado pela histeria envolvendo a produção, vai ficar impressionado pelo trabalho de Wilde tanto quanto atriz, quanto como diretora. Diga-se de passagem que sua Bunny é a personagem mais complexa e interessante do filme.
Tendo lido o roteiro original (que foi completamente reescrito), é interessante como Wilde parece ter entendido o twist muito mais como uma motivação para as mulheres da história, do que necessariamente o motivo para o filme existir. A reviravolta não é difícil de prever, mas isso não quer dizer nada, afinal tudo o que as outras duas longas horas de duração apresentam são muito mais interessante do que aqueles 15 minutos.
Toda a pompa de um filme de prestígio - com grandes cenários, cenas cheias de diálogos longos, rápidos e difíceis (alguns aí não deram conta, ein?), uma trilha sonora ridiculamente bem conduzida e nomes estelares no elenco - não consegue esconder o que Wilde realmente fez: um filme de Horror B muito caro. No fim de um terceiro ato deliciosamente bobo e explosivo, ela crava sua obra como um potencial clássico cult que vai ser moldado nos próximos anos. Algo muito parecido com o que aconteceu com Garota Infernal, de Karyn Kusamana. Vocês me cobrem por essa afirmação: as pessoas VÃO revisitar esse filme e a resposta VAI ser diferente… Tome o tempo que precisar.
Porém os problemas são bem aparentes… E agora chegou o momento de falar DELE.
Harry Styles foi um tiro no pé. Não existe outra forma de falar sobre isso. Contratar uma estrela da música para atuar em um suspense político e contracenar com uma atriz extremamente experiente, indicada ao Oscar (importante frisar), é algo tão burro que não dá pra falar sobre esse filme sem ressaltar o tanto que o cantor é amador. As cenas dele contracenando com Florence chegam a ser constrangedoras do desnível aparente em tela.
No fim, Não se Preocupe, Querida, é um filme elevado por sua diretora. É bom, mas não atinge seu potencial enquanto obra cinematográfica e, infelizmente, vai ser muito mais lembrado pelo completo caos dos bastidores do que realmente foi feito. Uma pena, já que o resultado está longe de ser tão desastroso quanto muita gente têm compartilhado por aí.
É apenas um Filme B muito caro e que esbanja de uma produção e direção absurdamente componente. A bem da verdade é que a Florence Pugh conseguiria vender um comercial de pasta de dentes como a salvação do cinema e se a Olivia Wilde dirigisse a gente provavelmente teria um potencial Oscar de Melhor Curta-Metragem.
DON`T WORRY DARLING
EUA | 2022 | 2hr 3min.
Direção: Olivia Wilde
Roteiro: Katie Silberman
Elenco: Florence Pugh, Harry Styles, Chris Pine, Olivia Wilde, Gemma Chan, KiKi Layne
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