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  • Foto do escritorJoão Neto

[Crítica] Jovens Bruxas: Nova Irmandade parece um piloto rejeitado da The CW

Atualizado: 17 de fev. de 2021

É até irônico que a melhor forma de descrever a nova roupagem de Jovens Bruxas seja uma das frases mais icônicas de seu filme original: leve como uma pena, rígido como uma tábua. Vinte e quatro anos após as bruxinhas mais descoladas de Los Angeles tocar o terror uma nas outras, recortar um pedacinho delicioso da década de 90 e figurar rostos como Neve Campbell pré-Pânico, Fairuza Balk completamente surtada e Robin Tunney com uma das perucas mais descaradas da história do cinema, o clássico cult de Andrew Fleming ganha uma repaginada atual sob a direção de Zoe Lister-Jones (Band-Aid) e produção da nossa querida Blumhouse.


Subtitulado Nova Irmandade, o novo filme não é apenas um soft-remake, mas também uma sequência do original (e isso nem chega a ser spoiler pois esse plot twist já foi entregue no próprio trailer). Apresentando uma nova formação de feiticeiras, a trama segue a jovem Lily (Cailee Spaney) que se muda para uma cidade nova após a mãe (Michelle Monaghan) encontrar um novo amor (David Duchovny). Ganhando não apenas um padrasto mas três meio-irmãos, a garota encontra dificuldades em se encaixar na escola até que conhece Frankie (Gideon Adlon), Tabby (Lovie Simone) e Lourdes (Zoey Luna), três amigas bruxas que estão a procura de um quarto elo para fechar seu clã.



Antes que eu comece a discorrer sobre o que gostei e o que não gostei (e aviso que essa segunda categoria está cheia), quero deixar claro que eu não sou o tipo de pessoa saudosista que odeia remakes. Não amaldiçoo a sétima geração dos envolvidos quando um projeto do tipo é anunciado pois gosto de ver novas perspectivas de histórias clássicas e creio que sempre há a oportunidade de trazer algo relevante pra mesa. A própria premissa de Jovens Bruxas dá abertura para isto. É o que Nova Irmandade poderia ter feito, é o que ele tenta fazer e é o que ele falha miseravelmente.


Desde os primeiros dez minutos, fica claro qual é a intenção deste filme. É reformular a história para uma geração conscientemente desperta, tentando trazer comentários mais atuais sobre feminismo, sororidade, sexualidade, diversidade, entre muitos - ênfase no MUITOS - outros tópicos que você verá esbarrando pelos personagens ao longo da uma hora e meia de duração... E isso é ótimo... Em teoria. Afinal, o contexto de muita coisa mudou desde o filme original e abordar essas temáticas com personagens diferentes é uma chance de conversar com novas audiências, abrindo a porta até para uma representatividade maior.


Mas é a maneira indiferente que o roteiro de Lister-Jones tenta abraçar o maior número de causas sociais possível, sem sequer ter um cuidado para desenvolvê-las apropriadamente, que deixa escancarado o quanto esse filme é um caça-níquel dos safados. Provavelmente nem é culpa dela, provavelmente o próprio projeto (anunciado antes da sua contratação) foi encomendado com esse pretexto (consigo imaginar perfeitamente os executivos sentando e discutindo sobre um remake woke pra agradar o público atual). Mas porra, se for pra fazer, façam direito!



O roteiro é tão superficial que todas as personagens parecem ter sido baseadas em quizzes do Buzzfeed, tamanho o despreparo para escrever sobre adolescentes. É uma visão quadrada e nada convincente, quase uma sátira da Geração Z, com alguns diálogos tão dolorosos que poderiam facilmente terem saído da boca daquela sua tia que tenta se enturmar com os mais jovens. O pior talvez seja como as personagens sequer tem personalidades, sobrando pras atrizes se sustentar com o próprio carisma e esse descaso fica ainda mais absurdo quando você tem entre o quarteto principal não apenas uma atriz, mas uma personagem trans invisível.


Provavelmente você não ouviu o nome dela no filme, porque ele na verdade só é mencionado uma única vez, mas a Lourdes (Zoey Luna) é talvez um dos maiores desperdícios dessa versão. Sua personagem, assim como as outras, não possui muitos traços individuais de personalidade e isso fica ainda mais problemático quando algumas das suas poucas falas se referem à sua transgeneridade. O roteiro flerta com a discussão em alguns momentos, mas nunca chega a desenvolver de maneira apropriada. Não, não é necessário que toda personagem trans tenha sua identidade construída em volta da sua transgeneridade. Mas, é problemático quando esse é o seu único traço de sua personalidade trabalhado no roteiro. E nem precisamos ir muito longe para encontrar personagens bem-trabalhadas, só lembrar da Jules em Euphoria e a Bex em Assassination Nation (inclusive, leiam este artigo incrível falando sobre ela).


Entre os outros tópicos que o filme flerta, mas nunca chega a desenvolvê-los completamente estão: a solidão da personagem negra no grupo de amigas, a bissexualidade do bully da escola, masculinidade tóxica e por aí vai. A verdade é que o roteiro parece ter seguido uma cartela de causas para comentar mas é muito raso para se aprofundar em qualquer uma delas. É descarado. Para vocês terem noção, há uma cena em que um bully está atormentando um aluno gay e pra ensinar uma lição, as bruxinhas transformam o casaco dele num casaco com as cores da bandeira LGBT... E todos riem... Pois essa é a forma que o roteiro encontra pra humilhá-lo......... Francamente...



Saindo um pouco disso (e percebendo enquanto finalizo esse texto que ele é pior do que eu pensava), é um filme mais leve e mais bobo que o original. Portanto, você não vai ver coisas como góticas fumando feito caiporas, invocando demônios, assassinatos, cobras no lugar de dedos e outras coisas do tipo. Mas vocês podem se deparar com as meninas congelando o tempo pra tirar fotos, pentagramas feitos de glitter e diálogos tão constrangedores que dá vontade de enfiar a cara na almofada e gritar.


Fechando tudo com um clímax horroroso que parece ter saído de um episódio perdido de Teen Wolf e ainda tentando arrancar algum traço de emoção com uma reviravolta (que já mencionei, ESTÁ no trailer), Nova Irmandade tenta ser uma nova voz pros desajustados, mas só serve pra mostrar como o original envelheceu como vinho. Esse aqui envelhece feito leite assim que os créditos sobem.


JOVENS BRUXAS: NOVA IRMANDADE

USA | 2020 | 94 min.

Direção: Zoe Lister-Jones

Roteiro: Zoe Lister-Jones

Elenco: Cailee Spaeny, Gideon Adlon, Lovie Simone, Zoey Luna, Michelle Monaghan e David Duchovny


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